Lembranças do Pinhal, por Mary Lou Paris

No início dos anos 1990, fui pela primeira vez à Fazenda Pinhal, em São Carlos, interior de São Paulo, convidada pela minha amiga Sofia Carvalhosa.

Nessa época, a casa, construída na primeira metade do século 19, já tinha abrigado de tropeiros a autoridades do Império, tinha sido restaurada pela Helena (descendente dos donos originais da fazenda) e o Modesto, pais da Sofia, e estava impecável. Linda.

Com mais de 150 anos, a propriedade era cheia de cantinhos em que Helena servia quitutes preparados na fazenda e onde o papo corria solto. De manhã, muitas vezes a gente ia tomar banho numa cachoeira encostada no pomar. No almoço, éramos sempre muitas pessoas sentadas numa mesona bem comprida na sala enfeitada com louças antigas, que se misturavam com uma mandala ou alguma coisa mais “criativa” saída das mãos da Helena. Vasos com plantas e flores por toda parte. Também tinha a senzala, um imenso terreiro e o pomar com alamedas centenárias de jabuticabeiras carregadas de frutas.

Fui muitas vezes para lá, muitas com meus filhos, que eram amigos dos filhos da Sofia, e sempre tinha algum encanto inesperado. Uma vez passamos uma tarde friorenta de inverno ouvindo um Madrigal de que minha memória não me deixa lembrar o nome, que cantou na capela da casa e depois foi ao pomar, entrou numa “catedral” formada por uma clareira dentro de um imenso e bojudo bambuzal, e lá cantou até a chuva não deixar mais.

Minha última ida foi na despedida da fazenda, que era tombada pelo patrimônio histórico e havia sido vendida. À noite, a Sofia, a Helena e eu levamos uns colchonetes para o terreiro e nos deitamos lá para olhar o céu estrelado, quando chegou a Marina Melo, filha da Sofia e do Josimar Melo, cantora e compositora maravilhosa que cantou para nós e para a paisagem deslumbrante que se estendia pra lá do terreiro. Ah…

Muitas vezes, os hóspedes-cozinheiros que iam ao Pinhal deixavam receitas num caderno que ficava na entrada da casa, e essas delícias estão no livro Fazenda Pinhal, caderno de receitas e história de família, organizado pela Helena, junto a relatos sobre os tempos antigos da e na fazenda. O livro tem um lindo projeto gráfico do Carlito Carvalhosa e da Mayumi Okuyama.

Entre as cerca de 200 receitas que você encontra no livro, lá estão, por exemplo, as “batatas aos murros com creme azedo”, da Paola Carosela; o “souflê de goiabada”, da Sílvia Percussi; do “frango com maracujá”, da Margarida Cintra Gordinho; o “linguado tricolore”, da Tuna Dwek; o “penne à la Queca”, da Olívia Byington; e o “pudim do Pinhal”, da Mari Hirata, além de receitas da própria Helena a e da sua irmã Carmen Vieitas Vergueiro, “mestre-cuca de primeira qualidade, que desde pequena exercia a sua arte num fogãozinho a carvão”.

Se quiser conhecer o livro, ele está disponível em e-book:

http://digitalizabrasil.com.br/e-books/fazenda-pinhal